Cada vez mais interessadas no blockchain, as empresas relacionadas à prestação de serviços globais estão investindo em conhecimento para saber quais os benefícios que essa nova tecnologia oferece e como poderão utilizá-la em seus processos.
As operações de transporte logístico em âmbito global podem obter ganhos significativos para uma potencial transformação generalizada da forma como operam atualmente. Tanto órgãos governamentais, como autoridades alfandegárias, quanto empresas privadas estão manifestando interesse em utilizar a tecnologia blockchain como um elemento fundamental para transações comerciais mais robustos e sistema de gerenciamento de riscos mais aprimorados.
Apesar de todo o interesse, ainda existem impasses que permeiam a implantação por completa em todos os agentes do comércio exterior. Um destes contratempos, sem dúvidas, é o Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR), que sujeita empresas envolvidas na comercialização internacional às normas estabelecidas pela União Europeia (UE). As incertezas legais que o GDPR gera para organizações, que estão desenvolvendo ou considerando a possibilidade de aderir ao blockchain em sua cadeia de suprimentos, em primeiro momento não foram intencionadas, porém, ainda é um dos fatores que cria insegurança nos empresários.
O GDPR é conhecido por coletar e regular processamento, transferência e retenção de dados pessoais relacionados a indivíduos, empresas e organizações da União Europeia. Na interpretação das normas GDPR, ‘dados pessoais’ referem-se, de forma ampla, a qualquer informação relacionada a um indivíduo identificável que inclua, sem limitações, nomes, sobrenomes e endereços de email.
Enquanto o blockchain é uma cadeia de armazenamento de dados compartilhado que pode ser distribuído em vários computadores para manter os registros inalteráveis, o GDPR prevê que os indivíduos tem o poder de, entre outras questões, realizar solicitações como alterações e exclusões de dados pessoais. Uma verdadeira ameaça para o bom andamento do blockchain, que requer dados pessoais.
Na prática, o regulamento GDPR concede aos indivíduos direitos que conflitam com a coleta de informações necessárias para o funcionamento do blockchain, como: solicitação para que dados pessoais sejam corrigidos, restrição de processamento de dados, transferência de dados de uma empresa para outra, poder para excluir seus dados pessoais.
No comércio exterior, dada a grande quantidade de indivíduos e de documentações – como instruções de embarque, cartas de crédito, conhecimentos de embarque, documentos alfandegários, por exemplo – necessárias para a realização de transporte de cargas entre os países, o blockchain figura como a solução para uso na cadeia de fornecimento.
Baseados no blockchain, e criando um registro projetado para ser imutável, os aplicativos utilizados nos processos de importação e exportação podem, por exemplo:
- Fornecer informações aos consumidores sobre o histórico e o ciclo de vida dos produtos que adquirem;
- Receber as novidades mais recentes de cada processo sobre o deslocamento da mercadoria diretamente na caixa de entrada no email;
- Simplificar os esforços para determinar a remessa a qualquer momento;
- Mapear a causa de atrasos ou danos;
- Dificultar o envio de produtos falsificados;
- Evitar o desvio de remessas de seus destinos fatídicos.
Porém, tendo em vista que, a medida que estes registros obtiverem informações restritas de dados protegidos pelo GDPR, o uso desses aplicativos baseados em blockchain pode se tornar impreciso e gerar inconformidades não intencionadas.
As discussões a respeito do assunto que envolve GDPR e blockchain levam a diversas questões legais sobre o possível uso dessa tecnologia na cadeia de suprimentos internacional. Por exemplo: utilizar o blockchain para a transmissão de Bill of Lading – conhecimento de embarque – ajudar a evitar transações fraudulentas. Por outro lado, este documento pode obter informações pessoais e, como o blockchain torna a alteração de dados impraticável, dificulta a capacidade do indivíduo de mover ou excluir seus dados pessoais, como prevê a regulamentação GDPR.
Enquanto o blockchain é promissor em diversos sentidos para o comércio exterior, o GDPR impõe direitos que se chocam justamente com uma das principais vantagens do blockchain: a transparência. Mover dados para fora do blockchain resolveria de imediato a questão do GDPR, em contraponto anularia a proposta dessa tecnologia, criando maior complexidade, reduzindo a segurança de dados pessoais e comprometendo a transparência do processo. Toda essa alteração traria dificuldades no desenvolvimento de padrões para o blockchain.
A questão GDPR versus blockchain ainda é uma incógnita para o mercado de comércio internacional e necessita a atenção das autoridades sobre o assunto, tendo em vista os benefícios para a cadeia de fornecimento globais e crescimento das economias internacionais. Fica claro que a velocidade de resposta das leis e regulamentações é significativamente menor quando comparada a velocidade que a transformação digital e suas tecnologias, como o blockchain, avançam.